quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Feliz tempo novo

Como vocês notaram, faz uma data que a pessoa não atualiza o blog né? A labuta diária, iniciando normalmente às 3h da matina me fez sair um pouco de tempo na vida. Fiquei sem fazer as coisas que mais gosto e quando conseguia fazer, ficava tudo muito cansado. Normal. Esse é o tempo de trabalhar duro.

Como boa aprendiz do jogo do contente, logo resolvi tirar proveito dos vários nasceres de sol que vi em diversos pontos da cidade. O melhor de todos foi no Alto 13 de Maio. Pra quem nunca foi, esse é o ponto mais alto da cidade e de lá, dá pra ver as melhores coisas do Recife: o mar e o Arrudão!!! É lá pras bandas do Vasco da Gama. Lindo! Chegamos lá pontualmente às 3h e começamos a armar o nosso circo, ops set. E aí as pessoas começaram a fazer seu cooper, morro acima, morro abaixo. E uma senhora da caminhada matinal/madrugadal logo nos informa que só faltam 10 minutos pra ele surgir lá no horizonte. Bem no tempinho dito por ela, lá vem ele, forte, lindo. O sol. No seu tempo ele vem subindo e aí essa mesma senhora pára e abre os braços de frente pra ela contemplando. Aquela luz linda dos primeiros raios, aquela pele sofrida e essa alegria simples da alma, do estar vivo. Aí ela olha pra mim e diz: “fia, isso é a coisa mais linda”. Concordo. Fico só com a vontade de dizer que mais do que o sol, ela. Pena que a câmera estava apontada para uma outra coisa que não aquilo. Nada mais verdadeiro do que aquela criatura moradora daquele morro contemplando o sol. Mas publicidade não é isso né? Mas isso são outros quinhentos... O outro amanhecer foi dentro do rio. Ontem fiz um passeio de catamarã das 3h às 5h30. Lindo nascer do sol dentro do rio. Pura poesia.

Voltando ao tema do tempo, no finde passado fui pro interior de Minas com o Nego, Palula, Renata, Zé Cândido e Caris. Eita cidadezinhas lindas. Pra se ver: outros tempos do Brasil. Pra se vender: santos, oratório e relógios. Pra se beber: vinho e pra comer Tutu e pão de queijo. E pra se divertir essa galerinha maravilhosa que fez com que meu corpo e mente se alterasse pra voltar ao tempo do ter tempo.

Mas ter tempo de quê? Fiquei viajando nisso. Na questão do tempo. Li umas linhas de alguns filósofos. O tempo do movimento de Aristóteles, o ser e o tempo de Heidegger só me deixaram ainda mais confusa com relação ao tempo. Aí sabe do que mais. O tempo é o de cada qual.

Tem gente que pensa no tempo que vai ser. Que vive o tempo de agora pensando no tempo que ainda vai chegar. Tem gente que vive o tempo de agora, do instante no tempo que já passou, como estrelas. Tem pessoas maravilhosas que conseguem viver no tempo de agora e ponto. São felizes hoje. Isso é bom. Tem gente também que não vive em tempo nenhum, na verdade o tempo vive e move elas, vivem esperando o tempo de viver até se acabar.

Eu sei não. Acho que a gente passa tempos de um jeito e de outro. Confesso que quero ter paz de espírito pra ter tempo de ter tempo e aproveitar o tempo que se tem e ser feliz e fazer o bem (eita rimou). Espero que nesse tempo de hoje e de amanhã e de sempre, a gente consiga amar mais, sorrir mais, fazer mais pessoas felizes, respeitar mais, ser mais companheiro, ser sempre honesto, humilde e solidário. Um feliz tempo novo pra todos nós.

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Overdose de alegria

Na última quinzena estive deveras ocupada com o mundo da publicidade. É a parte da minha labuta que muitas vezes acho fútil e boba, ainda mais quando vem acompanhada de gente muito mesquinha, cheia de milindres, sarcasmos e veneno. Mas quando isso começa eu penso logo em Deus (mesmo) e fico concentrando o juízo para não perdê-lo.

Um dos raros dias de folga calhou bem num sábado ensolarado. Eita que coisa boa, que energia linda e quantas cores reluzem num sábado de sol nessa cidade. Botei logo meu biquíni, que agora é de laçinho (acho que isso é o início da fase balzaquiana, colocar biquíni de laçinho sem ligar muito pras gordurinhas). Pois bem, lá vou eu linda e loira sozinha pra praia. Logo começo a ligar pras amigas praieiras e rapidamente formamos um mulherio à beira-mar.

As conversas vão embaladas pela cerveja, ondas e pela alegria que parece estar entranhada nas pessoas que vão à praia. Pra mim é um dos melhores programas da cidade. Adoro ver a quantidade de gente se divertindo e o outro pedaço divertindo as pessoas - batalhando pra ganhar a vida. Nesse quesito Tuba é o campeão.

Ele, junto com suas 14 piscinas de plástico, dois baldes, um ajudante e sua filha me fazem acreditar que o mundo está aí pra quem quiser, que de fome ninguém morre, que o importante é ter força e correr atrás, ganhar a vida honestamente. Sim, também que não tem publicitário que chegue aos pés da criatividade de Tuba: ele aluga piscinas por hora na praia de Boa Viagem onde não se pode tomar banho de mar por conta dos TUBArões. Ele monta a piscina, o ajudante vai pegar a água do mar, que é devidamente peneirada para não ter sargaço, e sua filha anota a hora e local do negócio numa folha de papelão. Na hora combinada, ela volta pra fazer a cobrança e normalmente a gente fica mais um tempo. Nessa brincadeirinha, Tuba deve aumentar a renda familiar em uns cem contos por finde.

Lembrei de Tuba porque pra mim ele é o ícone da alegria na praia, ele e Tia Júlia, barraqueira da melhor qualidade do primeiro jardim. Enfim, no sábado a que me refiro, não encontrei Tuba, mas me diverti deveras. Achando pouco a alegria praieira, resolvi ir pro campo de futebol. Jurava que seria uma overdose de alegria. Não fosse o Santinha ter entregue a vitória no final, não teria problema ter chegado num estádio um tanto quanto vazio, sentar do lado do sol e tomar cerveja frevo. Num foi uma overdose não, mas foi de bom tamanho, do tamanho que deveria ser e que me encheu de força pra agüentar mais uma dura semana de gente pequena e nefasta.

domingo, 28 de outubro de 2007

Sonhos

Acabei de ler o Estuariope de Sama, uma crônica ótima que fala sobre sonho. Há algum tempo eu notei, na ante-sala do consultório, durante os cinco minutos que antecedem os 40 que me deito no divã, que eu não tava mais com sonhos. É que ecoava uma música que todos nós ouvimos muito, pelo menos em 80% dos dias das mães nas escolas por aí. Tocava num radinho bem longe, na voz maravilhosa de Milton, Maria Maria. Nela, tem um verso que diz é preciso ter manha, graça, é preciso ter sonho, sempre!

Ai fui lá cascavilhar os meus sonhos e descobri que não tava sonhando! Oxi, Carolina, bebeu gás foi? Foi só o que eu pensei. Como uma pessoa não tem sonhos? Como uma pessoa pode não estar sonhando com nada? Quando eu era pequena, eu sonhava em ser presidente que era pra melhorar a vida das pessoas, não ter pobreza, nem injustiça. Acho que esse sonho era tão difícil que esqueci como se sonhava.

Mas depois da descoberta da falta de sonhos identificáveis na vida, resolvi logo arranjar uma tuia de coisa com que sonhar, e sonhá-las. Sonho com o Pe na Rua, sonho em fundar uma instituição que possa formar ou profissionalizar pessoas, sonhos em realizar meus documentários.

Sonho em ver o meu amor e o do Nego se bulindo em forma de gente. Sonho que essas criaturas possam ser criadas na casa 1 do condomínio que a gente vai construir. Sonho que sempre que puder, vou para Boa Viagem num dia de semana, tomar cerveja e depois continuar tomando cerveja no Bar do Cabo. Sonho em viajar com meus pais e o Nego, sonho em ser madrinha do casamento de Thaís, sonho em ter sempre esses amigos, sonho em nunca sentir angústia nem solidão, sonho em dar tempo de ver um mundo mais justo nessa minha vida que eu sonho, que só se acabe lá bem na frente quando eu tiver bem velhinha. E ainda por cima disso tudo, sonho que os sonhos se realizem sempre com manha e graça!

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Uma boyzinha no ônibus

Desde os dezoito que abandonei o bom e velho busão. Como boa filhinha de papai, ao completar a maioridade, herdei o Uno da minha mãe, que, de tanto sofrer na minha mão ficou apelidado de Chacrinha - o velho guerreiro. De Chacrinha pra cá, tive outros automóveis e pegar ônibus virou uma prática em extinção.

Como vocês sabem, há dois anos que juntei meus mijados com o do Nego e na cota dos mijados foram os nossos carros que viraram uma Doblô. Ótima, maravilhosa, espaçosa e que na época das vacas magras salvou a gente porque a alugávamos e seus caraminguados renderam direitinho. Enfim, quando estávamos sem carro, táxi na cabeça. E agora que não a alugamos mais, ficamos eu e o Nego fazendo um balé de horários pra gente sair junto de casa e voltarmos também. Um dando carona ao outro. Hoje o carro é meu, hoje é teu. Enfim, cedendo daqui e cedendo de lá. Exercício diário de casório.

Até que (re) descobri o ônibus. Teve uma belo dia que eu não precisava chegar cedo no trabalho, podia voltar tranqüila da ginástica, ajeitar as plantas, curtir a nossa casinha e depois pegava um ônibus. Tinha acabado de ler a crônica de Samarone (no maravilhoso www.estuariope.blogspot.com) e me lembrei de como era pegar ônibus. Não tava afins de gastar 10 contos no táxi e resolvi gastar apenas 1,60 no busão. Liguei pra minha amiga Alice que me deu as coordenadas rumo ao Estrada dos Remédios. No primeiro dia, passei 40 minutos na parada errada, no segundo ia pegando o ônibus errado, no terceiro de tanto olhar as casinhas e pessoas, pisei no cocô e hoje foi o quarto e deu tudo certo.

O que eu gosto do ônibus é que você vê a cidade. É um momento que você pára, reflete, lê. Lembro que li demais no Engenho do Meio depois da aula no Salesiano. Oxi, eu pegava indo pra cidade que era pra ficar sentanda lendo. Chorei com Morro dos Ventos Uivantes, torci demais pra Olga Benário se safar, viajei para Macondo com todos os anos de solidão... Isso além de rir, eu morro de rir no ônibus.

Hoje mesmo a cobradora que já tava voltando pra casa paquerando com o cobrador da vez. Fazendo um trocadilho podre com o brega mais podre ainda que ecoava no sonzinho do coletivo. Sim, tem também o povo com quem você fala. Tem gente que até amigo faz no ônibus.

Confesso que ainda estou tímida. Só foram quatro viagens (a pessoa ser boyzinha é ridículo né?). Não costumo conversar muito com as pessoas não. Sempre dou só um sorrisinho, troco gentilezas, um bom dia, boa noite. É que prefiro ficar assim, meio no idílio. Sem engrenar muito uma conversa, pra depois não me decepcionar, nem me apaixonar. Nunca sento do lado. Prefiro ficar na liberdade da imaginação. Sim, liberadade é o que há de melhor em pegar ônibus.

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Carta de papel

Desde o último dia 19 que o meu cotidiano tem estado um tanto quanto revirado. É que meus pais viajaram e tive que voltar ao que eu sempre chamei de casa. Mas que hoje é a casa deles, não mais a minha. Mas essa questão do que é ou não a minha casa vai em outro post.

Hoje vou falar do amor. Eu, do meu jeito canceriano e melancólico fui remexer na gaveta de lembranças que a minha vó Ignez (sim é com g mesmo), deixou pra meu pai. Ele com todo zelo deixa toda a história dele ali, no pé da cama dele, na gaveta do criado, que é mudo.

Olhando tudo eu achei uma relíquia. A carta em que meu avó Pedro pede voinha em casamento. Do pouco que consegui ler, já que papel, diferente de sentimento, esfarela, ficou uma grande frase: “ hoje uma única corrente que me traz prisioneiro: és tu”. Eita valei-me que coisa linda (eu mesma achei). Há quem ache piegas, mas o amor é piegas mesmo.

A carta, de 12 de janeiro de 1942, data em que meu avô tinha sessenta e a minha avó trinta (uma solteirona para a época) é um pedido de perdão e uma jura de amor eterno. É que pelo que entendi, ele já tinha falado a ela que estava apaixonado, alguém entrou no meio e fez uma fofoca e ela entendeu como uma afronta. Realmente a bicha era braba. Mulher arretada. Do norte, quase nordestina. Bem, é com essa carta que ele tenta explicar melhor as coisas e diz que um dia a verdade vai vingar e que neste dia “o sol da realidade vai aquecer os nossos corações”.

E depois dessa carta minha avó viveu com ele, tiveram 3 filhos – Pedro, Paulo e José. Pense que açaí é o que pode haver de melhor para a vitalidade masculina já que meu avô gerou meu pai aos 72anos! Eles viveram juntos por quase vinte anos, até o dia em que uma pneumonia levou ele. E ela ali, cuidando e velando.

E tudo começou com essa carta. Que hoje essa neta, um tanto quanto piegas, retrata aqui nesse blog. As coisas podem até ser modernas, mas olhar a letra do meu avô nessa carta, pensar nele escrevendo, nela lendo e tudo o que aconteceu depois... Não tem modernidade que chegue.

Vou nessa ler as outras cartas escritas que têm aqui e vou escrever uma carta em papel pautado para alguém e mandar pelo correio. Simples.

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Os olhos de cada qual

Faz um tempinho que queria escrever sobre violência e hoje recebi um texto triste e lindo de Silvinha que disse tudo. Triste pelos olhos do menino visto também em tantos outros e lindo porque ainda tem gente, como Silvinha, com uma sensibilidade sem fim. Com a devida autorização, o texto segue abaixo e espero que ele emocione a todos como a mim.

O dia em que perdi o medo da morte
(Silvia Góes)

Era uma segunda-feira, onze horas da manhã, a semana chegava ainda, porque o domingo é preguiçoso e transfere a sua responsabilidade de primeiro dia sempre para a segunda-feira. Chegava perfumada, com aquele cheiro de terra quente acalmada pelo choro rápido de algumas nuvens, nada de tempestades. Odor de felicidade para mim, lembranças de uma infância em que os “banhos de chuva”, de calcinha bunda-rica no meio da rua, numa Garanhuns ainda mais interior, de final dos anos 70 e início dos 80, eram o retrato da alegria crua, o mais fiel que até hoje consigo ver. Há saudades que são verdadeiras orações.

Andava e andava, não, carreava, não é a mesma coisa, porque de carro a gente perde muito da beleza do chão, mas as quatro rodas existem e me ajudam a acompanhar o tempo de vez em quando. Prefiro andar, mas enfim, carreio mais do que queria por mais uma necessidade inventada. Dois meninos, um menor e outro maior, se protegiam dos pingos debaixo de uma árvore. Não passei por eles sem vê-los. Ambos estavam sentados, mas algo muito forte me levou aos olhos do mais crescido, uns dez anos eu acho, e trouxe os olhos dele para mim. Encontro. Vi. Desandei. Sabia que ele viria. Ouvi a sua raiva gritando nas retinas.

Ao longo da minha vida tenho encontrado algumas crianças muito tristes, em entrevistas, trabalhos por aí. Uma vez entrevistei um menino de oito anos que já tinha matado duas pessoas, tatuado por uma estrada cheia de sofrimentos, mas era uma criança e às vezes brincava e ria, até comigo ele brincou, aquela estranha que naquele dia chegava para saber da sua história, do nada. Hoje ele deve estar com uns 20 anos. Tomara! Não sei dele, não acompanhei, não criei raízes, infelizmente. Segunda-feira senti saudades dele. Há lembranças que são verdadeiros segredos do destino, nos ensinando a ser em sua dureza.

Olhei pelo retrovisor e vi o menino chegando. Passos lentos. Pisando o chão em que eu carreava de um jeito firme, resolvido. Tentei desviar, tive medo, desnasci. Ele mostrou a arma e pediu o celular e “todo o dinheiro de papel na bolsa”. Eu não tinha nem uma coisa e nem outra. Ele me odiava de um jeito intenso, com uma proximidade que eu nunca tinha visto antes. Então eu quis morrer. Nos olhos dele eu quis morrer. Disse que não me importava. Que vê-lo ali, me vendo daquele jeito, já tinha me matado. Ele virou as costas e saiu.

Nos olhos dele havia cicatrizes de muitas dores, tantas que os meus 32 anos de mundo não me ensinaram a contar, mesmo com lacerações na carne, nos ossos e no sangue que quase me derrubaram por duas vezes. Em mim, os olhos dele não se transformaram em mais uma cicatriz entre as que carrego debaixo da pele, mas numa nova ferida aberta para sempre no corpo da vida. E como tá doendo!

Talvez ele tenha percebido que eu me importava com ele e por isso não atirou, ou talvez a arma fosse de brinquedo, afinal era só um menino. Perdi a fé na vida por uma semana. Todos os dias passava pelo mesmo lugar procurando por ele outra vez. Queria encontrá-lo de novo. Ainda não sei para fazer o que, mas sigo tentando. Vivi meus dias seguintes, ressuscitei e inventei a cura para não fechar a ferida e mesmo assim ainda beber da chuva. A minha arma não é de brinquedo, é de verdade, chama-se amor, então decidi nascer para dizer que essa arma (a palavra tem coisas mágicas escondidas - arma é anagrama de amar) é a única capaz de matar a morte. E agora é minha missão dá-la de presente ao menino. Se alguém o encontrar por aí, peço por favor que o chame para brincar e tomar banho de chuva e que me avise, para que eu possa entregá-lo o meu regalo e caminhar com ele um pouco, com os pés no chão. Isso ele não pediu no assalto, mas podemos dar.

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Hoje é segunda!


O final de semana foi na praia. Por vontade própria, dormi na rede. Na real a intenção era acordar cedo, acordar com o sol esquentando o juízo e esfriar com um mergulho no mar. É bem verdade que o zumbido e as picadas das muriçocas atrapalharam um pouco o sono, mas não havia de ser nada porque a caminhada matinal seria impagável. E foi.

Com os primeiros raios de sol levantei da rede. Prontamente, botei o biquíni e lá fui andando. Não tinha ninguém. Apenas eu e meus pensamentos, o mar, a areia branca dos carneiros, os coqueiros e uma faixa de terra pra caminhar. O pé no chão, a pele começando a esquentar com o solzinho e a água friazinha no ritmo das ondas, banhando meus pés.

Ai que coisa tão simples e gostosa de fazer. Já fiz demais isso quando criança lá em enseada. Água azul prateada, cheiro de sargaço de infância, sol esquentando a alma. E esse banco de tronco de coqueiro enterrado na areia, o máximo! Fico lá sentada. Viajando.

Aí vem o mergulho. Será que vou nessa água fria? Claro que sim! Mergulho bom de levar qualquer quizila. Feito a primeira cerveja gelada da sexta, que abre todos os pensamentos. Mesmo na praia e com tudo isso, o finde foi de trabalho filmando. Mas estar trabalhando não importa. O que importa mesmo é que hoje é segunda e que o sentimento é de paz e uma energia sem igual.

Para Nego Nu

Obs.: A foto é roubada da internet, eu estava sem máquina

A cachaça do amor

Chego no bar. Marido, amigas e conversa jogada fora. Adoro esse ambiente. No meio da noitada chega aquele senhor na nossa mesa. Barba branca, muito branca. Coisas que a idade faz com o povo. Um sinal que mostra logo que essa pessoa é diferente de você, que é cheia de cabelos pretos, muito pretos e pouca, quase nenhuma experiência de vida.

Conversa vai, conversa vem, “ cerveja garçon” . Amigo, uma cervejinha que o copo ta vazio e coisa pouca é ruim. Aí a conversa do momento é amor. Aquele senhor vai e conta uma paixão, um amor. No caso dele, perdido. Aliás, deixado pra lá. E de repente as sobrancelhas brancas ficam mais cerradas e ele começa a chorar.

Chorar, chorar pelo grande amor não vivido. A explicação é que lá pelo início da década de 70, as histórias de vida foram tomando rumos diferentes e toda aquele amor foi sendo esmagado pela vida. As palavras não ditas, os gestos não feitos, o medo de errar, o medo de cair, o medo de mudar, enfim tudo foi ficando maior do que o amor e pronto. Aí, saiu a fatídica frase que indica cada qual pro seu lado.

As décadas seguintes só evidenciaram o que eles já sabiam. O amor é grande. Cada qual constituiu família, casou, separou e aí, nessa noite no bar, depois do choro e da grande história de amor, descobrimos que a mulher amada é tia de uma das amigas. Resultado: o senhor da barba branca está novamente com o destino nas mãos dele. Um guardanapo meio amassado com números dos telefones meio embriagados da mulher sempre amada.

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Pra Painho

Pense n’eu
Luiz Gonzaga

Pense n'eu quando em vez coração
pense n'eu vez em quando
onde estou, onde estarei
se sorrindo ou se chorando
se sorrindo ou se chorando
pense n'eu... vez em quando
pense n'eu... vez em quando

Tô na estrada, tô sorrindo apaixonado
pela gente e pelo povo do meu país
olêlê


Tô feliz pois apesar do sofrimento
vejo um povo de alegria bem na raíz
vamos lá

Alegria muita paz e esperança
na esperança de fazer tudo melhor
e será


Alegria o meu nome é união
e povo unido é beleza mais maior

Totalmente atrasado, segue texto pro dia dos pais. Sempre que ouço essa música que abre o post, me vem à cabeça a relação pai e filho(a). Não sei se porque o velho Gonzagão e Gonzaguinha, reza a lenda, não se davam tão bem; não sei se porque meu pai me ensinou a ouvir Luiz Gonzaga de pequena ou até porque o Nego se emociona sempre lembrando do pai quando ouve o véio rei do Baião. O que importa é que essa música é linda, Luiz Gonzaga e Gonzaguinha são a fina flor do sertão pernambucano e Pai é o que há de melhor.

O meu além de uma doçura incrível, é o que pode se chamar de um cara honesto. E dentre todas as lições que ele me ensinou, a maior foi a do bom-caráter. De feição, sou a cara dele, dos ombros largos à sobrancelha farta.

No meu Painho farta pouca coisa. Sobra mais. Sobra mais amor, mais esperança, mais alegria, mais carinho, mais honestidade, mais uma barriguinha linda e muito, muito conhecimento. Não é porque é meu pai não, mas é assim. Orgulho do mundo todo.
Desde sempre me lembro dele lendo. Não tem dia esse que ele não leia pelo menos umas duas horas. Foi assim, pelo conhecimento, pelas palavras e pelos meandros da economia que ele venceu.

Desde pequeno o menino do cabeção gostava de estudar. A velha Ignez, sem grana pra comprar caderno assim bonito feito o nosso, feito os que normalmente a gente usa, fazia um caderninho com papel de pão. Aquele papel que o pão vem enrrolado, sabe? Pois foi nesses papéis escuros que meu pai aprendeu a lição. Aprendeu tão certinho e com tanta luta que se formou, pegou uma carona no avião da FAB e migrou aqui pro Recife. Na época, o mestrado da UFPE era o melhor do Brasil. Com uma mão na frente e outra atrás, contando o dinheiro pro ovo e pro pão, meu velho entrou no mestrado aqui e logo virou professor.

Claro que pra ele um mestrado era muito pouco e então resolveu fazer mais outro e ainda um doutorado, esses últimos nos Estados Unidos. Foi aí que grande parte da minha infância se deu nesse país. E aí, depois de uns cinco invernos, muita leitura e carne moída, voltamos. Ele, claro, voltou a dar aula e segue fazendo isso desde então.

No caminho dele, a estrada dos primeiros 25 anos foi dura, mas ele sempre veio, como o Gonzagão, sorrindo com fé e alegria, apaixonado pelo seu povo. Os outros 30 anos estão sendo bem menos cruéis. E é com a aula e com suas pesquisas que ele acredita fazer a parte dele para um mundo melhor. Certo ele.

Quero muito que meus filhos aprendam com ele a lição. Espero que a filha que um dia devo ter, que por sinal se chamará Inês em homenagem à mãe dele, minha vozinha linda, aprenda com ele que as palavras levam você pra frente na vida e que a honestidade, o bom caráter são valores básicos e incontestáveis. Eles podem aprender também que pato no tucupi é um dos melhores pratos do mundo e que um beijinho, um cheiro e um abraço nunca é demais.

Para Painho, da sua filhinha (dito com sotaque paraense)

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Ói a tricolor no blog do santinha!!! (tão amostrada, a bichinha...)

Uma tricolor nas brenhas da Espanha - Por Carolina Vergolino



Estou eu andando nas brenhas da Espanha, quando dou de cara com esse estádio. A cidade chama-se Santo Domingo de La Calzada. O time lá é tricolor. Acho que se juntar o povo odinho da cidade e colocar dentro do nosso Arrudão aqui, não enche em a metade do estádio. Que luxo o nosso né? Ter essa torcida imensa, um mar de gente em três cores, maior do que uma cidade.

Temos sim que ter futebol, quem não faz leva, o lateral isso e o meia aquilo. Enfim, um monte de assunto que eu não entendo nada. O que eu sei é que o povo vibra, a massa fica louca e quando é gol o coração fica se bulindo mais rapidinho e o chão treme. Isso é bom demais.

Confesso ter passado alguns anos torcendo para outro time. Era só o famoso motivo para beber com os meninos da faculdade. Minha mãe ficava indignada, já que meu avô era Santa, muito Santa Cruz. Mas virei a casaca de volta, graças. Honrei a memória do meu avô que vivia de roupa de linho branca, tinha a pele preta e o coração vermelho!

www.blogdosantinha.com

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Criar raiz

Já faz um tempo que tento cultivar flores, mas nunca dava certo. Fazia de tudo. Regava todo dia, conversava, afofava a terra e sempre elas morriam. Domingo descobri que estava matando elas afogadas. Tava regando demais, cuidado demais. Toma pra tu!

Fui com Mainha (exímia jardineira) lá no Brejo, perto da antiga Fábrica da Kinitos lá pras bandas da Guabiraba. Lá as plantinhas são mais baratas e mais bonitas. Seu George, que devia ter pressão alta de tanto que suava, riu da minha experiência (ou falta de) em jardinagem e disse: “não pode regar todo dia não, fia; só três vezes na semana”.

Assim, me toquei que planta é feito gente. Se regar demais, afoga! Tudo demais, dá de menos. Se uma dia coloco água, no outro não. E de vez em quando, só de vez em quando e de surpresa, uma terrinha nova. Conversar pode sim, todo dia. E se sair flor novinha, pode até elogiar. Agora regar, regar mesmo, só dia sim, dia não.

Para todos os meus amores e minhas 3 roseirinhas novas e a gardênia.

Na carreira
Chico Buarque
Pintar, vestir
Virar uma aguardente
Para a próxima função
Rezar, cuspir
Surgir repentinamente
Na frente do telão
Mais um dia, mais uma cidade
Pra se apaixonar
Querer casar
Pedir a mão

Saltar, sair
Partir pé ante pé
Antes do povo despertar
Pular, zunir
Como um furtivo amante
Antes do dia clarear
Apagar as pistas de que um dia
Ali já foi feliz
Criar raiz
E se arrancar


Hora de ir embora
Quando o corpo quer ficar
Toda alma de artista quer partir
Arte de deixar algum lugar
Quando não se tem pra onde ir


Chegar, sorrir
Mentir feito um mascate
Quando desce na estação
Parar, ouvir
Sentir que tatibitati
Que bate o coração
Mais um dia, mais uma cidade
Para enlouquecer
O bem-querer
O turbilhão


Bocas, quantas bocas
A cidade vai abrir
Pruma alma de artista se entregar
Palmas pro artista confundir
Pernas pro artista tropeçar


Voar, fugir
Como o rei dos ciganos
Quando junta os cobres seus
Chorar, ganir
Como o mais pobre dos pobres
Dos pobres dos plebeus
Ir deixando a pele em cada palco
E não olhar pra trás
E nem jamais
Jamais dizer
Adeus
Obs.: eu ouço outra coisa sem ser Chico, eu juro!!!

quinta-feira, 26 de julho de 2007

Que meninice é essa que você quer preservar?

Sou mais riso, mais verdade e mais brincadeira. Sou a que não quer ser levada tão a sério, quero puder dizer besteira. Sou uma pessoa aprendendo a andar. Quero jogar, correr e cair.... e levantar.

Quero dizer eu te amo sem maiores conseqüências e quantas vezes essas três palavrinhas não se agüentarem mais no meu coração que tenham que sair pela boca. Sou leveza.

Quero ser eu mesma. Sou a que diz o que pensa com uma sinceridade sem fim, quero verdade. Quero sentar na grama e ouvir. Até conversa fiada. Sou amiga de subir em árvore. Sou aquela menina branquinha, de bochecha rosada, cabelo bem preto com dois pitós e pirulito na boca.

Quero sempre essa meninice dos seis anos, mesmo com vinte e lá vai chumbo.

As minhas meninas


Semana passada vi o documentário sobre Paulinho da Viola. Aquele senhor podre de chique e de uma doçura sem igual, termina dizendo: meu tempo é hoje, eu não vivo no passado, o passado vive em mim.

Ai pausa né? Com uma frase dessa a pessoa pára um pouquinho, pensa um tantinho... e...segue. No mesmo dia que ouvi essas palavras, fui a um encontro com as minhas primas (que da minha idade mesmo, são as únicas). Primas do coração porque nossos pais são amigos de coração e alma. Crescemos juntas. Vive em mim esse passado. Lembro de muita coisa. De longas férias e finais de semana em enseada dos golfinhos, de dormirmos nas casas das outras e lembro dos encontros bestas dos nossos pais que tínhamos que ir e achávamos o máximo.

Quando éramos pequenas tínhamos uma brincadeira que chamávamos “daquela brincadeira”. Que era só nossa, cumplicidade total. Viramos adolescentes e ainda assim todas sabíamos quem gostava de quem, dos primeiros beijos e otras cositas más. Os amores foram grandes, as fofocas também, as conversas intermináveis no quarto de cada uma, depois se mudaram para uma mesa de bar. E a cumplicade sempre imensa, mesmo.

Com a frase de Paulinho lá vou eu ao nosso programa. Fomos visitar a caçula de nós três. Acabou de casar. Eu, a do meio, acabei de voltar dessa viagem que vocês bem sabem e a mais velha acabou de ter neném. Cada qual com o seu presente. Cada qual no seu presente e todas nós nos reencontrando com o passado que mora na gente e que faz da gente tão íntima. Conversamos, tomamos vinho, conversamos mais. Colocamos nossas fofocas em dia e ficamos assim vivendo nosso presente com o passado que existe na gente.

Para Juliana, Mariana e pra João
Mais Chico!!!
As minhas meninas
Olha as minhas meninas
As minhas meninas
Pra onde é que elas vão
Se já saem sozinhas
As notas da minha canção
Vão as minhas meninas
Levando destinos
Tão iluminados de sim
Passam por mim
E embaraçam as linhas
Da minha mão

As meninas são minhas
Só minhas na minha ilusão
Na canção cristalina
Da mina da imaginação
Pode o tempo
Marcar seus caminhos
Nas faces
Com as linhas
Das noites de não
E a solidão
Maltratar as meninas
As minhas não

As meninas são minhas
Só minhas
As minhas meninas
Do meu coração

terça-feira, 10 de julho de 2007

Suburbano coração

Diz o pai dos burros que suburbano quer dizer aquele que mora no subúrbio ou ainda, que tem ou revela mau gosto. Bem, gosto cada qual tem o seu. No gosto que no caso é meu, suburbano me dá um sentimento de alegria incrívi. Para mim aquele que mora no subúrbio é forte, alegre e de uma simpatia sem fim. É essa a visão de subúrbio que mais me toca.

O cotidiano do meu trabalho me leva sempre sempre aos subúrbios da cidade. Essa é a parte que mais gosto dessa labuta. Falar com essas pessoas e ver como elas vivem. Gosto mais da zona norte, dos morros da zona norte. Claro que não sou uma doida romântica que anda admirando tudo como se não houvesse violência e desonestidade. Eu me cuido, mas não me intimido.

Domingo não foi o trabalho que me levou à paróquia do Vasco da Gama, mas compromissos familiares. O paradeiro foi um casamento coletivo, às três da tarde. Eram vinte e seis casais que estavam lá oficializando, no religioso, as suas uniões que já existem há algum tempo. Casais que já são casados, ajuntados, casando “perante os olhos de Deus”.

Tinha noiva de véu e grinalda. Tinha noiva de luva, brilho no cabelo, maquiagens absurdamente cuidadas. Todas preparadas com um esmero sem igual. Tinha noivo pequeno, grande, novo e velho, tinha inclusive um bebo. Fiquei imaginando o imenso emaranhado de histórias que existem em cada um daqueles casais. Histórias de vida, de amor, dos filhos que muitos já têm. E fiquei feliz porque acredito que o núcleo familiar é a salvação desse nosso Brasil e se esse povo que já é casado, tá casando, ta ratificando o amor, aí deve ter uma família.

Segue essa música de Chico que eu adoooooro

Suburbano Coração
Quem vem lá
Que horas são
Isso não são horas, que horas são
É você, é o ladrão
Isso não são horas, que horas são
Quem vem lá
Blim blem blão
Isso não são horas, que horas são

A casa está bonita
A dona está demais
A última visita
Quanto tempo faz
Balançam os cabides
Lustres se acenderão
O amor vai pôr os pés
No conjugado coração
Será que o amor se sente em casa
Vai sentar no chão
Será que vai deixar cair
A brasa no tapete coração

Quando aumentar a fita
As línguas vão falar
Que a dona tem visita
E nunca vai casar
Se enroscam persianas
Louças se partirão
O amor está tocando
O suburbano coração
Será que o amor não tem programa
Ou ama com paixão
Mulher virando no sofá
Sofá virando cama coração
O amor já vai embora
Ou perde a condução
Será que não repara
A desarrumação
Que tanta cerimônia
Se a dona já não tem
Vergonha do seu coração

segunda-feira, 18 de junho de 2007

Eu e Salete, no mesmo caminho

Será que tenho vontade e sensibilidade pra ficar atualizando esse blog? Depois que voltei, tento escrever mas não sai muita coisa. Tenho estado pouco só pra refletir. Pra olhar o mundo e pensar um tiquinho sobre ele, pra ter o quê escrever. Isso é engraçado. Tô sentindo falta de ficar só! Pode?

Pode! Ói que pode! Pois bem, cá estou tentando rabiscar, ou melhor digitar algumas letras, que juntas formem palavras, que estas concatenadas resultem em alguns pensamentos e visões de mundo que algum cristão (ou não) tenha vontade e paciência de ler.

E por ordem e graça do destino, desde ontem que entrevisto pessoas que aprenderam a ler agora: ganharam o diploma da alfabetização. É que a pauta das últimas 24h foi a formatura de 2500 alunos do Brasil Alfabetizado. Lá vamos eu, câmera, meu amigo Leco, meu velhinho Teo e o Padre a nos guiar na Doblô vermelho-sangue, rumo a essa tuia de gente. Chegando lá, tudo corre tranquilamente e lá vamos entrevistar as pessoas.

E tome um bando de gente, de tudo que é cor, de tudo que é jeito. Em comum, o nível salarial que não deve passar de 2 salários mínimos por família e o orgulho imenso de estar recebendo o certificado. Agora eles sabem ler. É verdade que uns nem tanto, só assinar o nome. Mas isso pra eles já faz uma diferença imensa, não ter mais que “passar a vergonha de colocar o dedo, minha filha”. Foi isso que Salete me disse, hoje lá no Totó, se bem que ela escreve e lê muito bem.

Salete tem 54 anos, aprendeu a ler nesse último semestre. Os olhos dela marejaram (os meus desde sempre) contando como ela estava feliz recebendo aquele diploma e como ela ficava orgulhosa de pegar um ônibus sozinha, de saber ler Curado-Caxangá, de não depender mais de ninguém. Contou da primeira carta que escreveu pras filhas e como elas ficaram orgulhosas dela. De que rasgou todos os documentos "de dedo" e tirou tudo de novo só pra ter lá seu nome assinado. De ser livre e de não ser mais cega, de poder ver um mundo diferente.

Salete quer ser promotora. Salete não acha que é tarde, ela anda pra frente com um ar triste de quem sofreu muito, mas com um brilho no olhar de quem ainda tem muita esperança. Salete aprendeu agora a escrever algumas letras, que juntas formam palavras, que estas concatenadas formam sonhos. Bem-vinda Salete ao mundo das palavras. E uma ótima primeira série para você.

terça-feira, 5 de junho de 2007

Cheguei


Já faz tanto tempo que não atualizo que cheguei foi logo em dois lugares. Em Santiago e, 3 dias depois, na minha casa!! Alegria dupla.

Chegar em Santiago é, é, é.... E aí eu nao consigo escrever nada! Sei lá, dá um sentimento de vitória e dá também um vazio. As flechas amarelas se acabam e você chega na catedral. É muito emocionante, mas acaba. É engraçado isso, é que agora você nao tem muito mais o que fazer ali... A minha chegada foi meio mágica porque quando eu tava chegando vou ouvindo a música da Carolina, aquela lá da lagarta, ecoando. Quando vi, era o artista que tava tocando gaita de fole, aí botei logo pra chorar né?

Na catedral, a missa foi linda. O padre vai falando: hoje chegaram 5 brasileiros de Roncesvalles, 2 italianos, 1 português, 5 espanhóis, nao sei quanto franceses e um monte de alemães e por aí vai. Muito lindo. Encontrei a túia de brasileiros amigos e depois da missa fomos comemorar a chegada. Fora os brasileiros tinha mais 1 portugues, 1 italiano, 3 espanholas e etc. Enfim, muito legal.

No outro dia fomos a Finesterre. O famoso fim da terra. Fomos de onibus, claro! Foi engraçado pensar que ali as pessoas chegavam, olhavam e achavam que a terra acabava. Que na linha do horizonte tinha um buraco sem fim. Bem, fica um buraquinho no peito da gente. Acabou-se a caminhada, a farra, o bem bom de celular nao tocar.

Mas também começa tudo novamente, o bem bom da vida da pessoa. Que vidinha boa a nossa né nao? A gente tem aperreio grande nao... Uma cena foi engraçada: quando olhei para o meu guarda-roupa só faltei infartar. Foi como olhar pro albuergue de Roncesvalles, ao contrário, é muita frescura! Ninguém precisa dessa quantidade de roupa nao...

Cheguei, entreguei umas coisas de Alumia (o documentário que estamos finalizando) e aí fui pra Japaratinga com o Nego. Mar, sol, estrelas, noite, lençol, toalha, cerveja grande, lagosta podre de barata na beira da praia... E o meu Nego do meu lado, ao alcance das maos! Que maravilha, aquilo só podia ser o paraíso. Ficamos na beira da praia esperando o dia terminar e as estrelas começaram a se acender, que coisa linda.

No mais tudo começa a voltar ao normal. Domingo almoçar na casa de Mainha, contar as coisas, mostrar fotos, delicia totalis. Ainda no domingo farrao com as amigas, enfim as atividades normais da pessoa. Confesso que na segunda voltar a trabalhar foi difícil, quase pego a seta amarela que eu tava vendo apontando pra fora do trabalho. Eu não acho meu trabalho ruim nao, mas é que férias é bom demais!

É isso meu povo, se der na telha continuio esse blog porque o caminho de Bolinho espero que seja longo, longo. O caminho real é ésse aqui, o da vida real da pessoa. Acho que no de Santiago aprendi a ser uma pessoa mais determinada e simples. E tive contato com outra coisa que foi a fé. To meio CarolA ahahah. Vi o divino em muitas coisas e também to vendo aqui na volta. Na verdade fico vendo o amor e acho lindooo. As coisas mágicas que acontecem no caminho rolam porque você está com o sentidos aguçados. Você está ouvindo, vendo, sentido tudo muito forte. Vou tentar ficar assim espertinho no meu caminho.

sábado, 26 de maio de 2007

Amanha, Santiago: é o fim do caminho

Águas de março - na versao Tom e Elis!


É pau, é pedra, é o fim do caminho

é um resto de toco, é um pouco sozinho

é um caco de vidro, é a vida, é o sol

é a noite, é a morte, é um laço, é o anzol


é peroba do campo, é o nó da madeira


caingá, candeia, é o Matita Pereira


É madeira de vento, tombo da ribanceira


é o mistério profundo


é o queira ou não queira
é o vento ventando, é o fim da ladeira
é a viga, é o vão, festa da cumeeira
é a chuva chovendo, é conversa ribeira
das águas de março, é o fim da canseira


é o pé, é o chão, é a marcha estradeira


passarinho na mão, pedra de atiradeira

Uma ave no céu, uma ave no chão
é um regato, é uma fonte
é um pedaço de pão

é o fundo do poço, é o fim do caminho
no rosto o desgosto, é um pouco sozinho

É um estrepe, é um prego
é uma ponta, é um ponto
é um pingo pingando

é uma conta, é um conto

é um peixe, é um gesto
é uma prata brilhando
é a luz da manhã, é o tijolo chegando


é a lenha, é o dia, é o fim da picada
é a garrafa de cana, o estilhaço na estrada


é o projeto da casa, é o corpo na cama
é o carro enguiçado, é a lama, é a lama


é um passo, é uma ponte
é um sapo, é uma rã
é um resto de mato, na luz da manhã
são as águas de março fechando o verão


é a promessa de vida no teu coração

É pau, é pedra, é o fim do caminho

é um resto de toco, é um pouco sozinho
é uma cobra, é um pau, é João, é José
é um espinho na mão, é um corte no pé
são as águas de março fechando o verão
é a promessa de vida no teu coração

É pau, é pedra, é o fim do caminho
é um resto de toco, é um pouco sozinho
é um passo, é uma ponte
é um sapo, é uma rã
é um belo horizonte, é uma febre terçã
são as águas de março fechando o verão
é a promessa de vida no teu coração


É pau, é pedra, é o fim do caminho
é um resto de toco, é um pouco sozinho


É pau, é pedra, é o fim do caminho
é um resto de toco, é um pouco sozinho

Pau, pedra, fim do caminho
resto de toco, pouco sozinho

Pau, pedra, fim do caminho,
resto de toco, pouco sozinho

sexta-feira, 25 de maio de 2007

Quando eu penso que nada mais vai acontecer...

Meu povo, faz tempo que nao atualizo nÉ? É que andei pelas brenhas da Galicia e mal e mal tem uma cabine telefonicapra ligar a cobrar pro Nego... Mas os dias foram conturbados. Tem muita coisa, ia dividir em dois, mas vai um mesmo. Quem quiser, le né?

Assim, na noite que postei o ultimo texto estava em Vega, num albuergeu delicia de brasileiros. Tinha comido feijao e arroz no jantar, dormi sozinha num quarto, delicia! Ai no outro dia de manha, acordei e segui pro Cebreiro. Subir lá nao é um negocio, digamos, simples. Uma subida miserável. De baixo eu olho uma montanha lá em cima e nela tem feito uma nuvem parada e pensei que nao seria possível ser alí, será? Claro que era né? Fiquei rindo da minha própria desgraça mas pelo menos andei, literalmente, nas nuvens.

Lá no Cebreiro tem casas imitando as que os celtas moravam. Adorei, as portinhas bem pequenas. Acho, quer dizer, acho nao, tenho certeza que tenho o biotipo dos celtas, me senti em casa ahahah. Como eu ainda ia andar muito, resolvi almoçar por la. Entrei num restuarante, tocando musiquinha celta... Ai a garçonete me pede pra sentar com um senhor que também estava só. Ok, fazia umas 4 horas que nao falava com ninguém e aceitei de bom grado a proposta.
O senhor tinha lá seus 70 anos, parecia um lord ingles, mas era mexicano. Ele vinha desde Le Puy (ou seja 1600km) e assim como eu, estava bem pertinho de Santiago. Do Cebreiro pra Santiago so faltavam 150km! O almoço foi maravilhoso, Guilherme com seu humor sarcástico me fez rir muito. Parecia um avó e uma neta conversando. Ao invés de fazer um blog, ele resolveu gravar num gravadorzinho suas experiencias no caminho. Umas das coisas foi uma cançao que umas freirinhas lá da frança cantam, cançao de santiago. Aqui ninguem conhece, lindo, lindo. Ele pediu pra que eu cantasse alguma coisa e eu cantei com minha voz rouca pra ele guardar um pedacinho daquele momento pra vida toda dele. Lindo.

Aí sigo eu para o meu destino final do dia. Vou por um caminho lindo, cheio de montanhas e me sinto a propria Julie Andrews em a Noviça Rebelde! Ai chego no meu albuergue e: lotado. A mulher me oferece uma barraca de camping. Ok, mesmo pq eu nao andaria mais 100m. Quando chego na barraca, xixi e pêlo de cachorro. Ai é demais né minha senhora? Tudo bem que a pessoa resolve tirar férias pra andar feito uma condenada, fazer bolha no pe, dormir com ronco e etc, mas dormir com xixi de cachorro já é demais! O pior é que quando vc quer brigar, so sai em portugues! Enfim, deixo a doida pra la e pego uma caronete pra outra cidade.

Chegando lá, uma túia de brasileiros! Oba! Ai, como de praxe, vou abrir a internet e bomba. Sabe aquela mulher, a Marcia, que eu disse que era parte da minha família aqui? Pois bem, neste dia recebo um email do outro brasileiro (aoutra metade da familia), dizendo que ela dormiu e nao acordou. Morreu. Nao pude crer. Como uma pessoa que tava tao feliz, tao livre, uma criatura que tem 2 filhos pre-adolescentes pra criar, uma criatura que tava cheia de planos dorme e nao acorda? Na hora nao conseguia nem chorar. Eu passei muito tempo com ela aqui e aqui tudo é muito intenso, ficamos muito amigas...

Vou me tremendo pro quarto e conto pros brasileiros que tratam logo de me encher de alegria. Um bom vinho, um bom queijo e um bom papo e a noite chega (sim pq ela so chega aqui às 22h30). Quando vou dormir, rezo e choro por Marcia, pelos seus familiares, pela seus filhotes que sao lindos... Enfim, fazer o q? Uma tristeza sem fim...

Mas como diria Chico e Toquinho, a vida é pra valer, é pra levar. Entao no outro dia, levanto e sigo com os brasileiros. Eles foram uns anjinhos pq me encheram de força e alegria pra continuar essa caminhada. Ja estávamos chegando perto dos ultimos 100km! Andei com eles quase 25km e cheguei num albuergue fofo. NO meio do nada, nao tinha nada a nao ser vacas, vacas e vacas. E coco de vaca, claro.

A galera resolve fazer ainda mais 18km. Eu nao ia aguentar, mais de 40km por dia pra mim era muito. Com muita pena e um medinho danado, fico lá, sozinha. O coraçao apertadinho, apertadinho. Entro na pousada da Carmen e me sinto na casa da minha avó. É uam casa de 1700 com fotos nas paredes, cheirinho de limpeza, uma delicia. A minha cama ficava abaixo da janela que tinha uma cortininha branca bordada e uma florzinha rosa na sacada, o cenário esquentou um pouco o coracaozinho. Sim porque naquela hora quase mando tudo às favas. Tava muito triste e o que eu queria mesmo era pegar uma aviao direto pros braços, pro abraço do meu Nego e chorar pela Marcia.

Tomo banho e fico um pouco na cama com aquele cheirinho de coco de vaca que tem nas fazendinhas... Resolvo descer para o comedor e aí Pedro, o marido de Carmem (a dona), me presenteia com seu sorriso banguelo. Aí um parênteses. Pedro tem um bom padrao de vida, sua camisa, por exemplo, era Lacoste, mas a saúde bucal na Espanha é um negócio, no minimo, estranho. Ele nao é o primeiro banguelo que eu vejo...

Enfim, Pedro, sua banguelice e simpatia ajudam a aquecer meu coracao. Ele me dá um livro de uma brasileira que fez o caminho há algum tempo e passou 15 dias ali com Carmem e os seus. Vivendo aquela vida da fazenda, cortando batata, lavando e plantando. Vivendo naquele lugar que o tempo parece que parou. O fim do livro era muito triste, enfim, toque a chorar em pleno comedor. Ai Pedro me poe uma taça de vinho da Rioja e me faz sentar numa mesa com 3 espanholas aqui da galicia. Conversamos muito. 3 Gallegas loucas. Somos as ultimas a comer, depois de 3 garrafas de vinho!

Fiquei com vontade de passar uns 2 dias ali, vivendo aquilo. Mas aquilo nao é a minha vida. Como diria o Nego: volta logo pra casa, pro nosso caminho e pros que virao! Isso ele só disse hoje, mas foi exatamente assim que eu me senti naquele dia. No outro dia acordei uns 20kg mais leve e saí cedinho pra começar a contagem regressiva até em Santiago.

Cheguei no marco que dizia que so faltavam 100km! Que alegria. Olhei pra pedra, bati nela assim como quem diz que é mais forte, sabe? Aí um cara, de nao sei de onde faz a mesma coisa, olha pra mim abre um sorriso e me dá um abraço! Enfim, estamos perto e somos fortes! Sigo e ele fica la, olhando para a pedra...

Agora a cada 500 m tem essa contagem regressiva. Muito bom! Dá força pra andar mais. POis bem, ontem eu tinha programado andar 32km mas quando chego no 26, meu joelho esquerdo começa a fisgar. Muito. A cada 10 passos, uma fisgada danada. Ai, nao. Me senti Rubinho Barrichello!!! Nao, de jeito nenhum. Resolvi parar para me poupar.

Ai parei num albuergue, novamente no meio do nada! No meio do nada quer dizer uma igrejinha romanica, umas 5 casas de pedra, um albuergue, uma maquina de coca-cola e muitas vacas! Chego e faço como tada vez: tomo banho, organizo minhas coisas, dou um cochilo e ai vou beliscar alguma coisa pra dormir. Quando estou no bar fazendo essa ultima coisa antes de dormir, chegam as 3 gallegas. Era 19h30 da noite e elas ainda iam para uma cidade a 6km dali. Ligaram para a pousada e ainda tinha uma vaga. Era a minha. Prontamente arrumo todas as minhas coisas. O povo no quarto do albuergue nao entende nada. A louca vai sair 20h da noite?
Exatamente. Feliz da vida andamos das 20h30 às 22h. Quando chegamos no albuergue, começa um toró inacreditável! Novamente a minha cama fica embaixo de uma janela. Ao invés da flor, durmo com a luz do relâmpago e com a forte percussao dos trovoes, da leveza dos pingos, do cheirinho de coco de vaca e com uns roncos, é claro.

Hoje andei 27km e só faltam 50km! Que alegria. A galicia é linda e estou feliz. Amanha quando começar a contagem regressiva de 50km pra baixo, vou começar a ficar verdinha (risos), pq to me achando a própria Incrivel Huck. Espero chegar na catedral antes da missa do botafumeiro, que é domingo às 12h! Vamos ver se da tudo certo né? Porque aqui, ninguem sabe.

As gallegas disseram que pisar em merda de vaca dá sorte. Entao estou com 100km de sorte aí na vida hein! E sabe o que mais? Aqui na galicia tem uma musica popular da Carolina. Parece um côco! Diz que na saia da Carolina tem uma lagarta e quando ela dança a lagarta se balança... Eu mostrei minha tatuagem, que também dança! Pois que dancemos, a Carolina e sua lagarta, pelos caminhos da Galícia, de Santiago, das estrelas e da vida!

segunda-feira, 21 de maio de 2007

Quem lhe disse que eu era riso sempre, nunca pranto

Meu povo nao sei se foi a vontade de chorar que tive ontem e nao o fiz, nao sei se foi a chuva que se anunciava e finalmente caiu, mas hoje chorei. Pense que chorei. Eu tava andando (claro) no meio de um vale lindo e ai coloquei o mp3 e tava aquela musica Samba pra Vinicuis com TOquinho e Chico.

A chuva lavando meu rosto, aquele vale lindo, a letra dizendo que a vida nao gosta de esperar, a vida é pra valer e que a vida é pra levar e me deu uma vontade imensa de chorar. Claro que nao perdi a oportunidade e chorei. Chorei por bem meia hora, andando e chorando.

Chorei de saudade. Das minhas avós, de Angelito, de Keka, do meu sogro que nem conheci, de Sandra, de Tia Fátima... Chorei de alegria de ter tanta gente legal ao meu redor. Chorei de melanciolia, minha vida passou como num filme. Chorei de felicidade das minhas pernas nao estarem mais doendo tanto e das bolhas nao estarem mais me aperriando. Chorei de ver aquela natureza toda, daquele vale bem grande. Acho que também chorei de felicidade de nao ter que subir ele (pelo menos por enquanto eheheheh). Chorei porque um casal de peregrinos na minha frente tava andando de mao dada, fiquei emocionada com aquele amor. Chorei de orgulho por faltar menos de 200 km e eu já ter andado mais de 300...

Fiquei lá repetindo a musica (adoro fazer isso). E chorei mais um tanto. Até que cansei. Ficou so a chuvinha geladinha batendo no meu rosto, mas nao tinha mais lágrimas nao...Depois coloquei o mp3 novamente no ouvido e tava tocando Oh Happy Day! Heheheh. Ai fiz o que há uns dias nao fazia: dancei uma dança improvisada, de todo o coraçao...


Samba pra Vinícius
(1982)
Samba
Música e letra: Toquinho e Chico Buarque



Poeta, meu poeta camarada
Poeta da pesada,
Do pagode e do perdão
Perdoa essa canção improvisada
Em tua inspiração
De todo o coração,
Da moça e do violão, do fundo,
Poeta, poetinha vagabundo
Quem dera todo mundo fosse assim feito você
Que a vida não gosta de esperar
A vida é pra valer,
A vida é pra levar,
Vinícius, velho, saravá


Poeta, poetinha vagabundo
Virado, viramundo,
Vira e mexe, paga e vê
Que a vida não gosta de esperar
A vida é pra valer
A vida é pra levar
Vinícius, velho, saravá
A vida é pra valer
A vida é pra levar
Vinícius, velho, saravá

domingo, 20 de maio de 2007

E fico eu com cara de Bambi na frente dos gringos

Cara de Bambi é como eu e minha mae ficamos quando a gente chora. O que é bastante normal (risos) com mulheres tao piegas como nós... Segue email que recebi hoje de D Teca, linda... A letra da música, é do Rei Roberto Carlos! (como diria Joao Baltar, vai te f%&$, Roberto Carlos).
Recife, domingo 20 de maio
Hoje na missa pensei e rezei muito por você, pelo seu caminho. Pra completar, Pe. Edwaldo resolveu cantar essa música (abaixo) no final da missa. Tive que respirar bem fundo e pesar em outra coisa para não sair da Igreja com aquela cara ridícula de Bambi!
Mas decidi mandar a letra pra você porque me lembrei também de uma coisa: lembra uma vez que eu fui pegar seu pai no aeroporto, ele não conseguiu chegar e estava o maior alagamento na Imbiribeira e eu consegui passar com meu celtinha branco? Pois, antes de me enfiar feito uma louca na água eu pedi a Nossa Senhora de Nazaré que estendesse o manto pra eu passar, porque era o jeito. O manto eu não vi, mas acho que senti, porque passei milagrosamente.
Assim, quando seu pé tiver doendo muito, seu joelho, seu corpo, quando você tiver muito cansada, peça a ela pra pegar na sua mão e lhe levar um pouquinho, que ela leva.
Nossa Senhora (1993)
Roberto Carlos - Erasmo Carlos

Cubra-me com seu manto de amor
Guarda-me na paz desse olhar
Cura-me as feridas e a dor
Me faz suportar
Que as pedras do meu caminho
Meus pés suportem pisar
Mesmo ferido de espinhos
Me ajude a passar

Se ficaram mágoas em mim
Mãe, tira do meu coração
E aqueles que eu fiz sofrer
Peço perdão

Se eu curvar meu corpo na dor
Me alivia o peso da cruz
Interceda por mim, minha Mãe
Junto a Jesus

Nossa Senhora me dê a mão, cuida do meu coração
Da minha vida, do meu destino
Nossa Senhora me dê a mão, cuida do meu coração
Da minha vida, do meu destino, do meu caminho
Cuida de mim

Sempre que o meu pranto rolar
Ponha sobre mim suas mãos
Aumenta minha fé e acalma
O meu coração

Grande é a procissão a pedir
A misericórdia, o perdão
A cura do corpo e pra alma
A salvação

Pobres pecadores, oh Mãe
Tão necessitados de vós
Santa Mãe de Deus
Tem piedade de nós

De joelhos aos vossos pés
Estendei a nós vossas mãos
Rogai por todos nós, vossos filhos
Meus irmãos

Nossa Senhora me dê a mão, cuida do meu coração
Da minha vida, do meu destino
Nossa Senhora me dê a mão, cuida do meu coração
Da minha vida, do meu destino, do meu caminho
Cuida de mim

sábado, 19 de maio de 2007

Quem disse que pra baixo todo santo ajuda?


Quem inventou isso com certeza nao estava a pé! Podia estar numa ladeira querendo pegar o carro no tranco, podia estar de bike pra nao pedalar, podia estar no skate, o que for, mas a pé essa criatura nao tava nao! Descer dói demais os pés, o joelho, tornozelo. Dói tudo.

Hoje foi rojao. Quase 35km, vale ressaltar que passando os Montes de León. Aí era a gente indo e a chuva atrás. Sabe aqueles trovoes? Aqueles que ve (ouve) em filme? Eh tao alto, tao grande, que nao da nem pra ter medo, pq se for pra ter, tem que ter muito! A gente nos Montes de León e o leao rugindo atrás de nós mas gracas, a chuva nao nos alcançou. O bom é que o clima ficou muito bom pra andar, sem sol muito forte. Lindo esse lugar, mas nenhuma foto ficou assim legal.

Bem, subimos cerca de 600m e descemos mais mil, ou seja estou mais estrupiada ainda. De lá de cima, quando vi o tanto que a gente tinha que descer, deu vontade de me transformar numa bruxa. Pensei em invocar as almas das bruxas que foram queimadas por essas bandas, na inquisiçao. Pedir para elas transformarem meu cajado em vassoura, minha toalha nojenta de bebe em capa e voar! Dá muita vontade de voar...


Depois de toda essa descida, como presente, me dei uma noite num hostal. Sozinha. Que delicia, vou dormir muito. Um quarto só pra mim? Nem posso crer... Os 15 euros mais bem aplicados de toda a minha vida.

Pois bem, no início achei que nao fosse chegar e fiquei pedindo pra alguma coisa legal acontecer, sei lá. Qualquer coisa pra me dar ânimo, porque eu tava com os pes doendo já no início. Mas o pior é que é assim mesmo, quando esquenta é que pára de doer mais um pouco. O meu presente foi que o sol nao esquentou muito e apareceu um senhor, um professor de Sevilla. Esse cara, de nome totalmente normal (ufa!), andou comigo boa parte do tempo. Uma simpatia, Ricardo. Acaba que o dia foi mais rápido pra nós dois.


Fora passar por um monte de cidadezinhas que estao ressurgindo com a peregrinacao, mas que em grande parte ainda estao em ruínas, a gente passa pela cruz de ferro. la as pessoas colocam recadinhos, fotos, como ex-votos. Tinha uma bandeira do Brasil e eu coloquei um recadinho também, que nao ia perder a oportunidade né? Quem nao fala, Deus nao ouve.

No mais, muito cansaco. Estou em Ponferrada, terra dos templários. Tem um castelo, de verdade ahahahah. Fui a uma exposicao, mas to com preguica de escrever, tá? Segue fotos minhas trelando no alto da igreja, as ruínas, os recadinhos e é isso. Torçam por mim que ja apareceu mais 2 bolhas e meu joelho esquerdo ta doendo muito. Mas é que hoje foi pau! Xero pra todos.

sexta-feira, 18 de maio de 2007

Valiente!


Pessoal, hoje estou numa cidade completamente medieval. Chamada Rabanal del Camino, tem 60 habitantes e 4 albuergeus (hoteis). A cidadezinha voltou a existir por conta do ressurgimento da peregrinacao no caminho.

É assim: o pastor Pelayo descobriu os restos de Santiago no ano de 813. A noticia correu e a partir de 840 começaram as primeiras peregrinacoes. Ai tome gente a vir, e as cidadezinhas começam a nascer, muita ponte e hospital (que é só do que peregrino precisa). Por conta da peste e das guerras, no século XV, começa a decadência do caminho. Um arcebispo chega até a esconder os restos de Santiago por 300 anos com medo de um ataque. A partir do século XVIII alguns peregrinos de coragem (o que é uma redundância) começam a fazer o caminho novamente. Mas muito tímido ainda. Em 1867, no dia 25 de julho, dia de Santiago, só 40 gatos pingados estavam na catedral. Enfim, a partir dos anos 80, o papa Jopao Paulo II visita Santiago e depois Paulo Coelho escreve seu livro e ainda o governo dá uma forcinha transformando as velhas escolas rurais em refúgios para os peregrinos. O resultado é que no primeiro ano Santo (que é quando o dia de Santiago cai num domingo) desse século, 179.944 pegaram a compostela. Para quem nao sabe, a compostela é um documento que atesta que vc fez o caminho, a partir dos carimbos de cada lugar que vc vai. Isso tudo é pra dizer vcs saberem a quanto tempo rola essas andanças por aqui.

Nessa cidadezinha que estou tinha um monte de hospitais. Hoje nao tem nenhum, so albuergues, mas deveria ter porque eu, pelo menos to lascada. Acho que depois de tantos dias andando o corpo começa a penar. Nem a parada lá de um dia deu jeito. Hoje costurei o pe pela primeira vez (se der tempo ponho a foto). Costura e bolha e deixa a linha dentro pra nao criar outra. E estou com alguma reacao alérgica na mao que ta toda pipocada e coça e arde. Fora as dores normais nos joanetes e musculos. Toda estrupiada, a menina. Acho que agora começa mesmo a parte peregrina da história, a parte da dor.


E acho que meio pra me preparar pro que começa a se anunciar, coisas inusitadas aconteceram. Lembra aquela missa que eu disse que assisti, lá em granon? Pois bem, a missa foi como eu disse, muito, muito bonita. O padre fez a bençao em diversas línguas e disse: preparem-se voces nao serao os mesmos depois desse caminho. Falou que muitos peregrinos vem pela festa, outros pelo corpo, outros por turismo, mas que nao importava, a alma de cada um ia mudar. Todo mundo diz isso mas fico achando viagem, sabe? Confesso que esqueci esse meu sentimento e fiquei realmente emocionada com as palavras lá do padre de grañon. Nessa mesam missa tinha uma freira... Depois fomos dormir ao lado da igreja, que era um anitgo hospital de peregrinos. Aí lá vamos nós dormir nesse lugar super acolhedor mas que, confesso, fiquei meio com medinho. Imagina quanta gente se curou, mas tb quanta gente nao morreu na idade média ali naquele lugar. Mesmo com essas caraminholas na cabeça e os roncos nos ouvidos, dormi. Acordei, despedi-me dos brasileiros e peguei um onibus de grañon pra santo domingo, de lá pegaria um pra burgos e depois outro pra león.


O onibus pra Burgos atrasou uns minutos e senta um senhor espanhol ao meu lado. Um velhinho SUPER alegre. Conversa, ri me fala com sao os Riojanos, que sao alto astral e tudo. Um gamela, tirou onda do meu cajado, - es una vara muy larga para ti, chica!! Pense num velho gamela, tirador de onda. Disse que no dia anterior, por conta da festa na cidade, tinha feito farra até às 3h30 da manha, mesmo com seus 75 anos. Enfim, o velho de uma simpatia sem igual. Ai ele me pergunta meu nome e de onde venho. E eu digo Carol, Brasil. Tu pareces una portuguesa, chica! E eu pergunto o nome dele: Jesus (guardem bem, Jesus).

Aí sigo pra burgos, de la pra león. Quando chego em Leon vou la pro monastério benedictino de las hermanas cabajalas. Assisto uma missa linda, toda cantada por elas, com aqueles orgaos imeeeensos e tal. Ai quando acaba a missa, uma freirinha, aquela lá da missa de grañon que eu disse num desses parágrafos acima, me reconhece. Fala comigo e pergunta se ta tudo bem, de onde eu sou e diz pra ter muita fe no caminho e na vida. Diz tudo aquilo com um olhar... Uma coisa muito forte. O nome dela é Pietá...

Aí saio pra caminhar nas ruas de Leon e pergunto a um senhor onde esta a catedral e acaba que ele me acompanha, pra mostrar. E tome o povo a falar com ele pelas ruas, as lindas ruas de León, por sinal. E eu penso que to andando com um vereador, sei la o q. O cara é padre. Vôte, é a religiao fechando o cerco.

E ainda nos últimos dois dias encontrei uma senhora super legal, mais perdida do que nem sei. O engraçado é que funcionei meio como anjinho dela. Toda vez que ela tava perdida, eu achava ela. Impressionante! Sabe o nome dela? Pilar, como la Virgen, chica, que nos acompaña pelo camino.

Valei-me. Contei tudo isso pro Nego e ele perguntou o que eu tinha entendido da história. Até agora nao entendi nada nao, mas to esperta! Fico só um pouco impressionada e to procurando força nesses acontecimentos. Cumapdre, fico lembrando da tua frase, força na peruca ahahaha, fico rindo sozinha.

Por falar em sozinha, to me achando o máximo. LEmbra num dos primeiros textos que eu disse que nao ia so nem a servserv? POis bem, ontem fui comemorar aniversario de casamento com meu Neguinho num jantar chiquerrimo. Coloquei meu vestido de festa (que me serve como camisola, roupa pra frio e tudo mais), minha linda havaianas e fui jantar no Hotel e Reastaurante Gaudi, em Astorga. Chique toda. Tomei sozinha metade da garrafa de vinho, comi um ensalata mista, um pescado e uma tarta de chocolate! Brindei ao nosso amor e fui dormir feliz da vida.

Estar só me dá outro status aqui no caminho. Acaba que todos os peregrinos ficam meio cuidando de vc. Sabem se vc chegou ou nao, se vc esta bem. Todo mundo pergunta com quem estou e digo: sóla! E todos respondem Valiente, muy valiente! Eu nao tava achando muito nao, mas acho que nos proximos dias sentirei o peso da valentia e da coragem. Ai vou me lembrar do olhar incrível de Pietá, o sorriso largo de Jesus e da disponibilidade de Vicente (o padre) e chego, com força na peruca, em Santiago!

quarta-feira, 16 de maio de 2007

Isto é....


...saudade e por hoje é só.

terça-feira, 15 de maio de 2007

Santo Domingo: toureiros, tricolores e vinho tabelado (oba!)!


Galeras, estou eu com minha trupe de brasileiros andando, até que chegamos a Santo Domingo de La Calzada. Cidade do interior de La Rioja. Aqui vale um adendo. OS vinhos de La Rioja sao o que há. Já tomei de toda qualidade. Nao vejo nem o rótulo da frente, tem um rotulo especial de La Rioja que pra mim já vale. Tomei até um artesanal que nao tinha rótulo algum e foi maravilhoso. Vale ressaltar que tudo tabelado (risos) 3 euros. Os ultimos dias foram de afinar o sangue.

Sim, voltando. Logo na entrada de Santo Domingo dou de cara com o "estádio" do time local. Qual minha surpresa: somos tricolores!! Hum já saquei que essa cidadezinha vai ser o que há. Nao tínhamos nem programado parar aqui mas... A gente pára onde quiser, nao tem isso de ter que fazer nada. Estamos de férias. Peregrinando, turigrinando, que seja, a gente faz o que quer.

Ai era o dia do santa da cidade. Santo Domingo, claro. Entao já que tem quermesse, bora ficar. Arranjamos um chaozinho num albuergue e ficamos por lá. Fomos na Catedral. Linda, lá tem sempre um casal de penosas lindas num altar. Reza a lenda que se o galo cantar na hora que você entra na catedral, você tem sorte pro resto da vida. Bem, quando entrei o galo deveria estar fazendo a siesta dele porque nao rolou nem uma piadinha de nada. Entao tudo aqui é o tal do galo e Santo Domingo que foi uma criatura que dedicou boa parte dos seus 90 anos a melhorar a rota para os peregrinos. As galinhas entram na história por conta de um milagre atribuído ao santo. Salvaram um peregrino e responderam aos pais que procuraravam o filho "tu hijo está tan vivo como la gallina que me estoy comiendo", resultado galinha aqui virou peça de igreja.

Pois bem, depois da parte religiosa lá vai a gente pro profano. Eu pensava que o que ia rolar era tipo uma vaquejada. Quando entramos, era uma Tourada. Sim, daquelas que matam os pobres tourinhos. Ai, que agonia. O povo fica lá gritando mata-le!! O povo torcendo pro toureiro e a gente pro touro. Toma, bem feito, covarde, eram nossos gritos de guerra! Teve uma hora que nao aguentei mais e fui saindo, ai um senhor pega no meu braço e diz: fica, es muy bonito!. Deus me livre e guarde meu senhor, respondo em bom portugues (risos).

Recebemos uma aula do porteiro sobre o assunto. Sim, porque a gente ficava quse na saida pra hora de matar o touro a gente poder se esquivar. Descobrimos que aquela tourada era fuleira. Os toureiros eram aprendizes e que consequentemente, se chamavam novilheiros. E que cada touro daquele custou uns 2 mil euros e em touradas grandes chega a 35 mil euros! E que hoje em dia eles estavam bem bonzinhos, que uma veterinária ficava lá pra olhar o grau de ruindade. Se passar das regras, se maltratar muito o touro, rola multinha braba! Bem, na cabeça da gente nao dá pra entender direito, mas vamos lá respeitar os costumes de cada qual. Teve um novilheiro que se saiu muito bem e ai toda a arquibancada levanta balançando os lencinhos e ele ganha: a orelha do touro! ECA!!! Ah, tah bom disso, vamos tomar vinho de la Rioja que é o que há!

Sim, hoje nao vou andar. É a parte que vou pular. Agora estou em Burgos e já já vou a León. A foto na fonte foi em Grañon onde tem um albuerge massa, um antigo hospital de peregrinos. Um hospitaleiro gente da melhor qualidade onde fizemos um jantar comunitário e na Igreja teve uma missa super emocionante para os peregrinos. Também hoje me despedi dos meus amigos brasileiros e voltei a ficar só, só, somente só... Hum deu uma saudadinha deles. Foram meus pais aqui nesse caminhozinho de meu Deus. Gente que a gente leva pro resto da vida! Xero Armando e Marcinha

Beijos para todos e valeu pelos recadinhos, é um carinho danado que vou levando no caminho.